quinta-feira, 20 de maio de 2010

Sapatos e vernizes

Sapatos e vernizes

Valéria Motta

Uso sapatos que refletem algum estado de espírito. Formas mais apertadas capazes de fazer o passo sangrar... sinto vergonha de prender tanta dor... e alívio quando piso livremente em sonhos flocados...espuma delicada que esparge e brinca com o plantar. Sim, dedinhos falam, calcanhar se acalma e o feixe rijo de fibras e nervos arqueia para sustentar este corpo cansado de pisar com tanta cautela. Não é fácil mudar o ponto de equilíbrio, criar este pequeno espaço na alma dos sapatos. MAs é preciso sempre seguir adiante, escutando o que o chão tem a nos dizer.. seu segredos calafetados, assoalhos espelhados refletindo todo tipo de indiscreção.
Ando no caminho das veias e dos ossoinhos minúsculos. Me esforço para incomodar cada um deles, criando atrito com o verniz, marcando espaço na impossibilidade. Exercício diário de simplesmente ceder. Tudo de uma forma ou de outra se amolda... Para isso, arranco o canto das unhas com pinça para manter o rosto plácido e as mãos em paz com o verniz alheio... esta casquinha de brilho tolo.

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